segunda-feira, 11 de fevereiro de 2008

Heróis


Não sei porque todos me odeiam. Ou seria isso um exagero das palavras alheias. Não penso que isto seja verdade. Tenho uma porção maior que a mão de aliados. Mas até ai, tenho outra porção de inimigos. E eles me dizem sem remorsos, como se tivessem certeza do julgamento, que todos me odeiam. Não posso dizer que sim ou que não. Posso dizer apenas que eu não me importo com essas manifestações tão crassas. A muito já me liberei do caminho da sabedoria para atingir o caminho da humanidade. E vejo, portanto, com muita felicidade essas manifestações. A hipocrisia não faz bem nem aos pobres, nem aos ricos. Ela é venenosa. E não ter que enfrenta-la é por muito um salto gigantesco. Bem. Eu, político de Atenas. Homem de muito poucas palavras. Sinto-me muito feliz por eles. Esses que me odeiam.

Mas afinal, como não poderiam me odiar? Estou ciente da responsabilidade que cai sobre minhas costas. Sobre as coisas que irritam os alheios, os concidadãos. Sei muito bem que eles têm motivos. E bons motivos! Afinal quem dentre todos é o mais bem relacionado diplomata? Pois sou eu. Tenho aliados e amigos espalhados pelos quatro cantos do mundo. Da Pérsia à ilha de Creta recebo presentes e hospitalidade. Sou amigo daqueles que o povo odeia. Sou quem mantém a paz. Quem, dentre os humanos, não odeia a paz? Como a hipocrisia já foi vencida não me importo de não responder. A resposta é tão natural que não necessita de intermediários.

Sou eu afinal quem construiu todas as pontes e reformou, contra todos os poderes públicos, as nossas muralhas. Afinal, entre embelezar os templos e construir barcos o povo sabe o que prefere. Ah sim, ele sabe. Porque os deuses são os protetores de nossos homens. Por isso entendo que meu trabalho não seja tão apreciado. Fiz porque acreditava no que fazia. Fiz até o fim, sem ajuda, sem triunfo. Apenas por ideal. Apenas por beleza. Que raiva temos de homens com ideais. Mas que raiva devemos ter! Esses que insistem em comportar-se como heróis. Será que se acham os escolhidos dos deuses... Oras meus caros. Mas não somos todos nos escolhidos dos deuses?

Mas entendo do fundo de minha alma. Fazer cumprir as leis votadas não cria muita popularidade. É extremamente odiável, não acham? Eu, pois, acho. Mesmo assim o fiz porque não tive escolha. Minha ética não permitiu outra saída. Amaldiçoada essa que os homens chamam de ética. Tão difícil de definir! Tão inimiga dos interesses dos próprios homens!

Além disso, sei... sei porque sei. Sou rico. Rico de mais. E isso cria medo, eu compreendo. Homens não querem fazer negócios comigo. Estão todos corretos. Têm medo que eu os deixe para trás. Entendo. Afinal sou estudado. Estudei em Alexandria e sei mais de sete idiomas. Argumento muito bem em praça publica e possivelmente não existe homem em Atenas mais bem sucedido nos negócios. Obviamente que eu posso, e alias, devo, estar passando a perna nos negociantes. Eles sabem disso. Afinal a ignorância deles fica tão a mostra. Tão pura e tão fragilizada ao meu lado. Eles têm razões para me temerem, para me odiarem. Os espertos sempre passam a perna! Mesmo se você não tem provas disso. Mas quem precisa de provas quando se tem a sabedoria dos burros?

E ainda, além de todos os males que aflijo, sei que ainda existe um tão ou maior que os demais. Tenho a mais linda mulher de Atenas. E os mais virtuosos filhos. E sou, eu mesmo, atraente. E a beleza não fica impune. E nem deveria! Como posso ousar ter tanta sorte, tanta felicidade. Sou um mal entre os demais. Sou irritante a todos os demais.

Sou influente também. E não me submeto, não ajoelho a ninguém. Como todos os servos devem sentir ódio. Como todos esses que ajoelham sentem raiva. Afinal, venço os mais poderosos e a submissão não faz parte do meu vocabulário. Lidero. E, convenhamos, quem agüenta aqueles que não se curvam, que insistem em se considerar dignos de coisa mais alta. Eu deveria ficar no meu lugar! Mas me acho especial. Oras! Se fosse um deles teria ódio de mim. Muito ódio!

Pois eu entendo. Entendo sim. Entendo que a minha luta pelo que acredito trás à tona o fato das pessoas não saberem no que acreditar. Que os meus argumentos quebram os preconceitos tão difundidos e tão mais simples. Que as minhas ideais derrubam a burrice. Que o meu sucesso cause medo e inveja dentre os que não o tem. Que o meu estudo cause calafrios aos ignorantes. Que o meu poder de decisão crie tumulto nos indecisos. Que a minha falta de publicidade seja comparada com a publicidade deslavada dos narcisos. Entendo que o meu perdão cause constrangimento. Entendo que a minha liderança cause reflexão, e que por isso outros se descubram menos lideres. Entendo que eles me odeiem. Entendo profundamente.

Porque, em todos os cantos do mundo, do Egito à Macedônia, existe uma verdade universal. E apenas uma. Os fracos têm medo dos fortes.

Um comentário:

Rasputin disse...

O ditado prevalecia até a vinda de BILL GATES NERD OPRIMADO LIDER DA REVOLUÇÃO! heaheahea